Assalto ao Idioma Alheio
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Assalto ao Idioma Alheio
Exitei um pouco em qual secção fazer esse tópico, mas acabei por colocá-lo aqui de forma provocativa e "vacinativa" para que outros tomem consciência dessa tradição negativa brasileira.
Acredito que cada idioma que se aprenda, seja um novo mundo que se abra para o conhecimento e melhor entendimento de outros povos, costumes e riqueza cultural de cada um. Nada mais lisonjeiro que ver alguém falando, querendo falar ou aprendendo o nosso idioma para se integrar mais aos nossos costumes e acredito que a recíproca seja a mesma. O legal é a troca de dados!
Porém, nada mais deselegante (para ser elegante e não usar um termo mais pesado e merecido) que esculhambar com outros idiomas, como já vi gente respeitadíssima e culta fazendo, para ganhar a graça da platéia. Muito menos esculhambar o próprio idioma que fala, o qual desenvolveu a própria fala, o qual ouviu as melhores coisas da sua vida, o qual falou as melhores coisas da vida, o qual aprendeu a vida e isso desde o útero materno, ou seja, antes mesmo de nascer.
Certa vez um jornalista chamado James Capelli
fez uma excelente matéria para o programa Vitrine da TV Cultura, sobre o uso abusivo de termos em inglês, muitos usados indevidamente e outros grafados de forma errônea. Outros termos, totalmente desnecessários, eram fruto mais de uma pobreza pessoal de vocabulário devido a preguiça em procurar a palavra adequada ou por falta de cultura mesmo, onde recorria-se a facilidade de traduzir uma palavra do vernáculo para o Inglês para tornar uma frase (e quem a usasse) numa forma chique de se manifestar, que devido a ausência de termo equivalente. Naquele programa, uma professora norte-americana que lecionava Inglês em S. Paulo, não entendia o porquê de tanta veneração com a sua língua, pois reconhecia que o inglês é uma língua pobre perto do romântico Português. Esse romantismo está explícito na canção “ Only a dream in Rio” do outro James , o Taylor
Quando compramos o CD “Canções Curiosas” produzido por Sandra Peres e Paulo Tatit, na canção “Gramática”, abaixo, aprendemos a dar nomes a alguns bois:
- Barbarismo
- Idiotismo
O segundo termo não tem nada com o termo pejorativo (embora fique difícil não relacionar), pois a raiz dessa palavra é a mesma de idioma.
Gramática
(Palavra Cantada)
Composição: Sandra Peres e Luiz Tatit (abaixo Sandra Peres e Paulo Tatit da dupla Palavra Cantada)
Interpretam: Luiz Tatit e José Miguel Wisnik
[Imagem: palavra-cantada.jpg]
O substantivo
É o substituto do conteúdo
O adjetivo
É a nossa impressão sobre quase tudo
O diminutivo
É o que aperta o mundo
E deixa miúdo
O imperativo
É o que aperta os outros e deixa mudo
Um homem de letras
Dizendo idéias
Sempre se inflama
Um homem de idéias
Nem usa letras
Faz ideograma
Se altera as letras
E esconde o nome
Faz anagrama
Mas se mostro o nome
Com poucas letras
É um telegrama
Nosso verbo ser
É uma identidade
Mas sem projeto
E se temos verbo
Com objeto
É bem mais direto
No entanto falta
Ter um sujeito
Pra ter afeto
Mas se é um sujeito
Que se sujeita
Ainda é objeto
Todo barbarismo
É o português
Que se repeliu
O neologismo
É uma palavra
Que não se ouviu
Já o idiotismo
É tudo que a língua
Não traduziu
Mas tem idiotismo
Também na fala
De um imbecil
Muito antes disso li numa reportagem da revista Exame de Dezembro de l996, ( da qual emprestei para o título desse tópico, visto que até hoje continua o hábito) uma impressão semelhante:
Assalto ao idioma alheio
Preocupada com o atual estado outdate no qual a minha empresa se encontra, estive pensando seriamente em melhorar a performance dos meus funcionários com advanced courses promovidos on the job. Antes de mais nada, precisarei estabelecer um set de condições para o desenvolvimento das atividades de training e learning.
Pensei em promover um group development para elevar minha empresa à categoria de learning organization. São muitas as idéias que tenho estudado para colocar a companhia no ranking das top line, tais como: estruturar um processo de empowerment, criar um just-in-time office ou um virtual office, instituir o casual day e incorporar a mentalidade de intrapreneurship.
Vou contratar os melhores coachers existentes no establishment acadêmico, solicitando que façam um instruction on the job e permaneçam full-time em nossas instalações. Para isso devo ter como meta desenvolver uma equipe que atue one-for-all-and-all-for-one. Sei quanto será difícil distinguir o first best do second best nesse processo de reformulação, mas meu staff precisa estar preparado para atuar como um team work. Tenho dúvidas ainda quanto à metodologia - se deve ser top-down ou working groups. O importante, sem sombra de dúvida, é ter em mente a necessidade de obter um upgrade o mais rápido possível.
Para que minhas idéias fiquem mais clean, sentarei e farei um briefing de tudo que pretendo implantar. Vou escrever um paper e apresentá-lo aos principais managers da organização. Pedirei também aos consultores para prepararem um folder detalhando as metodologias da mudança. Claro que tudo muito simples, porém sempre voltado para o objetivo maior, que é obter um maior grau de personal effectiveness. Terei de manter um sistema infalível de follow-up, incentivando meus colaboradores a entender que hoje não é suficiente que eles possuam apenas know how, mas, principalmente, o know why.
Você ficou confuso com o texto acima? Não entendeu alguns dos conceitos ali expostos? Pois bem, não se sinta assim tão defasado. Sinta-se como um brazileiro - desculpe, brasileiro -, que tem se esforçado para acompanhar essa invasão arrebatedora da língua estrangeira em nossos textos, sobretudo nos da área de administração.
Se souber o significado de todas as palavras estrangeiras ali mencionadas, certamente você merece ser laureado com uma graduação de expert (desculpe o deslize). Caso desconheça algumas palavras ou expressões, saiba que poucas poderão ter seu significado desvendado nos dicionários de que você dispõe em casa.
Eu confesso estar assustada com a quantidade cada vez maior de expressões estrangeiras utilizadas na área empresarial. Se você acha que estou exagerando, saiba que todas as palavras acima mencionadas foram extraídas de textos lidos no período de menos de 3 meses, quando comecei a catalogá-las. Hoje conto com mais de 160 expressões. Convém destacar que não precisei caçá-las. Todas simplesmente surgiram nos artigos e livros que li, escritos, na sua maioria, por brasileiros como eu. Na área em que atuo, de treinamento e desenvolvimento, tenho deparado cada vez mais com prospectos de cursos e seminários com títulos em inglês, sem que haja qualquer razão plausível para esse assalto ao idioma alheio.
Por que isso? Num país como o nosso, com um vocabulário riquíssimo, pergunto-me aonde vamos chegar com essa overdose (perdoe-me mais uma vez) de palavras estrangeiras em nosso vocabulário. Não estou aqui fazendo apologia ao estilo dos franceses, que proíbem a utilização de palavras estrangeiras, perseguindo seus usuários com um afinco comparado ao dos não-fumantes aos fumantes. Palavras que têm tradução difícil ou imprecisa devem ser consideradas, mas não traduzir o óbvio, como paper, home, company, case, parece-me, no mínimo, um despropósito, fruto de insegurança de habitantes do Terceiro Mundo.
Recentemente atendi ao telefonema de um amigo que me contatou pelo celular para saber o que significava briefing, pois ele estava fazendo sua inscrição em um congresso e, caso quisesse participar do tal briefing, previsto para ocorrer no último dia, precisaria pagar uma taxa extra. O ridículo era que a recepcionista responsável pelas inscrições não sabia explicar do que se tratava.
Dia desses, num almoço, comentei sobre o teor deste artigo com um amigo. Placidamente, ele comentou: "Não sei por que tanta revolta. Como é que você pode achar isso tão estranho num país em que um dos jornais de maior circulação está distribuindo encartes para melhorar o conhecimento da língua portuguesa que têm o nome de Help?" Deixa estar que engoli meu café em silêncio, meditando sobre o assunto, e disse-lhe bye-bye.
*Andréa Marta Fanzeres Codorniz é psicóloga
Acredito que cada idioma que se aprenda, seja um novo mundo que se abra para o conhecimento e melhor entendimento de outros povos, costumes e riqueza cultural de cada um. Nada mais lisonjeiro que ver alguém falando, querendo falar ou aprendendo o nosso idioma para se integrar mais aos nossos costumes e acredito que a recíproca seja a mesma. O legal é a troca de dados!
Porém, nada mais deselegante (para ser elegante e não usar um termo mais pesado e merecido) que esculhambar com outros idiomas, como já vi gente respeitadíssima e culta fazendo, para ganhar a graça da platéia. Muito menos esculhambar o próprio idioma que fala, o qual desenvolveu a própria fala, o qual ouviu as melhores coisas da sua vida, o qual falou as melhores coisas da vida, o qual aprendeu a vida e isso desde o útero materno, ou seja, antes mesmo de nascer.
Certa vez um jornalista chamado James Capelli
fez uma excelente matéria para o programa Vitrine da TV Cultura, sobre o uso abusivo de termos em inglês, muitos usados indevidamente e outros grafados de forma errônea. Outros termos, totalmente desnecessários, eram fruto mais de uma pobreza pessoal de vocabulário devido a preguiça em procurar a palavra adequada ou por falta de cultura mesmo, onde recorria-se a facilidade de traduzir uma palavra do vernáculo para o Inglês para tornar uma frase (e quem a usasse) numa forma chique de se manifestar, que devido a ausência de termo equivalente. Naquele programa, uma professora norte-americana que lecionava Inglês em S. Paulo, não entendia o porquê de tanta veneração com a sua língua, pois reconhecia que o inglês é uma língua pobre perto do romântico Português. Esse romantismo está explícito na canção “ Only a dream in Rio” do outro James , o Taylor
Quando compramos o CD “Canções Curiosas” produzido por Sandra Peres e Paulo Tatit, na canção “Gramática”, abaixo, aprendemos a dar nomes a alguns bois:
- Barbarismo
- Idiotismo
O segundo termo não tem nada com o termo pejorativo (embora fique difícil não relacionar), pois a raiz dessa palavra é a mesma de idioma.
Gramática
(Palavra Cantada)
Composição: Sandra Peres e Luiz Tatit (abaixo Sandra Peres e Paulo Tatit da dupla Palavra Cantada)
Interpretam: Luiz Tatit e José Miguel Wisnik
[Imagem: palavra-cantada.jpg]
O substantivo
É o substituto do conteúdo
O adjetivo
É a nossa impressão sobre quase tudo
O diminutivo
É o que aperta o mundo
E deixa miúdo
O imperativo
É o que aperta os outros e deixa mudo
Um homem de letras
Dizendo idéias
Sempre se inflama
Um homem de idéias
Nem usa letras
Faz ideograma
Se altera as letras
E esconde o nome
Faz anagrama
Mas se mostro o nome
Com poucas letras
É um telegrama
Nosso verbo ser
É uma identidade
Mas sem projeto
E se temos verbo
Com objeto
É bem mais direto
No entanto falta
Ter um sujeito
Pra ter afeto
Mas se é um sujeito
Que se sujeita
Ainda é objeto
Todo barbarismo
É o português
Que se repeliu
O neologismo
É uma palavra
Que não se ouviu
Já o idiotismo
É tudo que a língua
Não traduziu
Mas tem idiotismo
Também na fala
De um imbecil
Muito antes disso li numa reportagem da revista Exame de Dezembro de l996, ( da qual emprestei para o título desse tópico, visto que até hoje continua o hábito) uma impressão semelhante:
Assalto ao idioma alheio
Preocupada com o atual estado outdate no qual a minha empresa se encontra, estive pensando seriamente em melhorar a performance dos meus funcionários com advanced courses promovidos on the job. Antes de mais nada, precisarei estabelecer um set de condições para o desenvolvimento das atividades de training e learning.
Pensei em promover um group development para elevar minha empresa à categoria de learning organization. São muitas as idéias que tenho estudado para colocar a companhia no ranking das top line, tais como: estruturar um processo de empowerment, criar um just-in-time office ou um virtual office, instituir o casual day e incorporar a mentalidade de intrapreneurship.
Vou contratar os melhores coachers existentes no establishment acadêmico, solicitando que façam um instruction on the job e permaneçam full-time em nossas instalações. Para isso devo ter como meta desenvolver uma equipe que atue one-for-all-and-all-for-one. Sei quanto será difícil distinguir o first best do second best nesse processo de reformulação, mas meu staff precisa estar preparado para atuar como um team work. Tenho dúvidas ainda quanto à metodologia - se deve ser top-down ou working groups. O importante, sem sombra de dúvida, é ter em mente a necessidade de obter um upgrade o mais rápido possível.
Para que minhas idéias fiquem mais clean, sentarei e farei um briefing de tudo que pretendo implantar. Vou escrever um paper e apresentá-lo aos principais managers da organização. Pedirei também aos consultores para prepararem um folder detalhando as metodologias da mudança. Claro que tudo muito simples, porém sempre voltado para o objetivo maior, que é obter um maior grau de personal effectiveness. Terei de manter um sistema infalível de follow-up, incentivando meus colaboradores a entender que hoje não é suficiente que eles possuam apenas know how, mas, principalmente, o know why.
Você ficou confuso com o texto acima? Não entendeu alguns dos conceitos ali expostos? Pois bem, não se sinta assim tão defasado. Sinta-se como um brazileiro - desculpe, brasileiro -, que tem se esforçado para acompanhar essa invasão arrebatedora da língua estrangeira em nossos textos, sobretudo nos da área de administração.
Se souber o significado de todas as palavras estrangeiras ali mencionadas, certamente você merece ser laureado com uma graduação de expert (desculpe o deslize). Caso desconheça algumas palavras ou expressões, saiba que poucas poderão ter seu significado desvendado nos dicionários de que você dispõe em casa.
Eu confesso estar assustada com a quantidade cada vez maior de expressões estrangeiras utilizadas na área empresarial. Se você acha que estou exagerando, saiba que todas as palavras acima mencionadas foram extraídas de textos lidos no período de menos de 3 meses, quando comecei a catalogá-las. Hoje conto com mais de 160 expressões. Convém destacar que não precisei caçá-las. Todas simplesmente surgiram nos artigos e livros que li, escritos, na sua maioria, por brasileiros como eu. Na área em que atuo, de treinamento e desenvolvimento, tenho deparado cada vez mais com prospectos de cursos e seminários com títulos em inglês, sem que haja qualquer razão plausível para esse assalto ao idioma alheio.
Por que isso? Num país como o nosso, com um vocabulário riquíssimo, pergunto-me aonde vamos chegar com essa overdose (perdoe-me mais uma vez) de palavras estrangeiras em nosso vocabulário. Não estou aqui fazendo apologia ao estilo dos franceses, que proíbem a utilização de palavras estrangeiras, perseguindo seus usuários com um afinco comparado ao dos não-fumantes aos fumantes. Palavras que têm tradução difícil ou imprecisa devem ser consideradas, mas não traduzir o óbvio, como paper, home, company, case, parece-me, no mínimo, um despropósito, fruto de insegurança de habitantes do Terceiro Mundo.
Recentemente atendi ao telefonema de um amigo que me contatou pelo celular para saber o que significava briefing, pois ele estava fazendo sua inscrição em um congresso e, caso quisesse participar do tal briefing, previsto para ocorrer no último dia, precisaria pagar uma taxa extra. O ridículo era que a recepcionista responsável pelas inscrições não sabia explicar do que se tratava.
Dia desses, num almoço, comentei sobre o teor deste artigo com um amigo. Placidamente, ele comentou: "Não sei por que tanta revolta. Como é que você pode achar isso tão estranho num país em que um dos jornais de maior circulação está distribuindo encartes para melhorar o conhecimento da língua portuguesa que têm o nome de Help?" Deixa estar que engoli meu café em silêncio, meditando sobre o assunto, e disse-lhe bye-bye.
*Andréa Marta Fanzeres Codorniz é psicóloga
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